LEASING – CONCEITUAÇÃO
O "arrendamento mercantil" adotado no Brasil tem pouquíssimas variações dos institutos internacionais que lhe deram origem, como o "leasing" americano, ou do "crédit-bail" francês ou ainda do "locazione financiaria" italiano, e tem como definição, até histórica, uma relação jurídica complexa, que se ampara numa simbiose das operações de locação, venda e financiamento.
No Brasil, na última década, as relações de consumo tem convivido com alguns tipos de arrendamento mercantil, entretanto, o mais complexo e usual para o consumidor é o denominado arrendamento mercantil financeiro, mais conhecido no meio empresarial como " financial leasing " ou "leasing" financeiro.
O "leasing financeiro" é a forma mais pura do "leasing" tradicional e se resume na operação pela qual uma instituição financeira especializada no setor, a pedido do interessado (arrendatário), adquire em seu próprio nome um determinado bem e, simultaneamente contrata o seu arrendamento com cláusula de opção de compra por um valor residual prefixado.
As razões do desenvolvimento desta modalidade negocial tem várias raízes, todavia destacam-se as vantagens fiscais que são concedidas a este tipo de operação e a possibilidade da arrendatária, utilizar-se do bem para incremento de seus negócios, quer diretamente (veículos para locadoras de veículos), quer indiretamente, (como máquinas industriais ou equipamentos para indústrias, etc.).
As arrendatárias, quando pessoas jurídicas, além de poder lançar o valor do arrendamento no rol das despesas (custos) com o negócio, podem, se o quiserem, optar por, ao final do prazo do arrendamento, entregar o bem, contratar novo arrendamento ou adquirir o bem pelo valor residual (valor deduzido da depreciação pelo uso e ou obsolescência).
A adoção deste instituto jurídico e modalidade negocial é medida altamente benéfica para a fazenda pública porque viabiliza o efetivo investimento na produção e no desenvolvimento da economia de uma forma geral; é também extraordinariamente positivo para a instituição financeira porque o mercado sempre foi farto de arrendatários além de se constituir em uma operação de baixo risco pelas peculiaridades do negócio; já para a indústria é uma poderosa modalidade de ampliar a produção e venda de bens duráveis ou de capital e, finalmente, é também vantajoso para o arrendatário que, pretendendo desenvolver seus negócios, não possua capital para imobilizar.
Entretanto, pela própria característica do negócio de "leasing" o bem deve ser destinado a complementar, facilitar ou viabilizar uma atividade econômica, caso contrário não se justificaria e perderia o sentido de existir.
Embora para a norma vigente desimporta que o arrendatário seja pessoa física ou jurídica, o "leasing", claro, somente será um bom negócio se atrelado a um objetivo ligado à atividade econômica do arrendatário, por isto, desde o Regulamento Anexo à Resolução 980, de 13 de dezembro de 1984, já constava:
Art. 14 - As entidades arrendadoras, em suas operações com pessoas físicas, devem observar, ainda, as seguintes condições:
a) somente podem ser objeto de arrendamento bens que sirvam à atividade econômica da arrendatária; e
b) devem se restringir:
I - Aos setores agropecuário, agroindustrial e demais atividades rurais;
II - às firmas individuais;
III - aos profissionais liberais e trabalhadores autônomos.
A norma fez constar esta restrição porque a desatenção com estes princípios poderia fazer com que os estímulos fiscais, a garantia do investimento e a ganância dos empresários do setor, pudessem desvirtuar o objetivo deste instituto jurídico e usar o leasing financeiro como mero substituto do financiamento disseminando-o no comércio de bens duráveis.
Lamentavelmente, com a revogação da resolução 980/84 pela resolução 2.309/96, foi exatamente o que aconteceu.
Atualmente o instituto do leasing tem servido predominantemente para mascarar algumas operações de compra e venda com financiamento, com benefícios fiscais e excesso de garantia para o arrendador, mas, sem nenhuma contrapartida ou segurança para o arrendatário.
Até pelos termos das cláusulas padronizadas, e inseridas nos contratos de adesão pelas arrendadoras, pode ser observado que o leasing direcionado ao consumidor final no Brasil, na maioria dos casos, não passa de uma farsa, no seu contexto não existem os elementos caracterizadores do instituto, pelo contrário, o jogo de cláusulas fez desaparecer a parte do instrumento que evidencia o arrendamento, porque não há no final do contrato qualquer resíduo a ser pago, vez que, com a figura do VRG, pago antecipadamente e até como entrada, o bem é quitado integralmente até o final do contrato subvertendo os princípios que orientam a relação jurídica de arrendamento.
No entendimento moderno o leasing brasileiro (arrendamento mercantil) é um misto de locação, financiamento e venda. A matéria publicada na RJ nº 223, pág. 5, da lavra do Ministro Cláudio Santos, do Superior Tribunal de Justiça, abordando as questões controvertidas do leasing, não deixa muitas dúvidas:
Disse antes cuidar-se de contrato de natureza híbrida e, efetivamente, vê-se no leasing uma aparência de locação, uma aparência de compra e venda a prestação, uma clara faculdade de utilização da coisa e uma nítida promessa unilateral de compra e venda. Não é só. Na modalidade mais importante economicamente, vê-se também um financiamento, porquanto nem sempre a coisa é disponível no mercado para ter seu uso cedido; muitas vezes é ela solicitada pelo arrendatário ao arrendador que a compra para arrendar ao pretendente e, assim, proporcionar-lhe a aquisição futura. Essa pluralidade de relações jurídicas leva a doutrina a conceituar o contrato de arrendamento mercantil como um negócio complexo, com a predominância do contrato de locação, muito embora sua concretização traduza um verdadeiro financiamento.
Fábio Konder Comparato, em seu conhecido estudo denominado "Contrato de leasing", publicado na RT 389, de 1968, diz que o leasing, "propriamente dito, não obstante a pluralidade de relações obrigacionais típicas que o compõem, apresenta-se funcionalmente uno: a "causa" do negócio é sempre o financiamento de investimentos produtivos." Todavia, logo em seguida, com respeito às relações obrigacionais faz a seguinte afirmação: "Sem dúvida, dentre as relações obrigacionais típicas que compõem o leasing predomina a figura da locação de coisa. Mas a existência de uma promessa unilateral de venda por parte da instituição financeira serve para extremá-lo não só da locação comum, como na venda a crédito."
Para o mestre Arnoldo Wald, em trabalho também pioneiro, cogita-se de um contrato pelo qual uma empresa "desejando utilizar determinado equipamento, ou um certo imóvel, consegue que uma instituição financeira adquira o referido bem, alugando-o ao interessado por prazo certo, admitindo-se que, terminado o prazo locativo, o locatário possa optar entre a devolução do bem, a renovação da locação, ou a compra pelo preço residual fixado no momento inicial do contrato." Acentua, ainda, que o arrendamento mercantil é uma "fórmula intermediária entre a compra e venda e a locação, exercendo função parecida com a da venda com reserva de domínio e com a alienação fiduciária, ..." (RT 415, de 1970).
O advogado Luiz Mélega, em livro com o título de "O Leasing e o Sistema Tributário Nacional" define o leasing, em sua forma ortodoxa, como um arrendamento, mas além de colacionar a opinião de vários juristas, dentre os quais, o já citado Fábio Konder Comparato, Benedito Garcia Hilário, com opinião igual a sua, menciona Sampaio de Lacerda, que considera o leasing uma típica operação financeira, Philomeno Costa e Thomas Benes Felsberg, para os quais o leasing não é uma operação financeira, mas uma operação comercial, onde o elemento financeiro é preponderante.
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Há 3 anos
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